Recebi este e-mail que levanta uma questão interessante, Vamos ao e-mail.
O Arthur, leitor que frequenta as linhas do HOMENS PELADOS , é um jovem gay que já está mais resolvido consigo, no sentido de entender e viver a sua realidade homossexual, e trouxe um relato que confere identificação com milhares de outros jovens homossexuais (e nem tão jovens assim)..
Relato de Arthur
Me chamo Arthur, tenho 20 anos e moro em Belo Horizonte/MG. Acompanho o HOMENS PELADOS há um bom tempo, e devo dizer que muitas das postagens foram de utilidade pra minha vida pessoal.
Logo quando conheci o blog, entrei em contato com
você Matheus por e-mail, e confesso que não me lembro mais por qual motivo, mas
me lembro que você me deu um conselho valioso.
O motivo de meu contato hoje é porque tenho um outro dilema nas mãos e preciso falar com alguém sobre isso. Há umas 2
semanas, eu estava matando meu tédio no infame bate-papo da UOL, e lá conheci um rapaz de 18 anos, também morador de
Belo Horizonte.
Como não tínhamos o propósito de fast-foda, nos identificamos por
estarmos ali e nos tornamos amigos. Desde o início ele se mostrou muito
receptivo e por várias vezes me convidou para ir até a casa dele, sem ao
menos ter me conhecido pessoalmente. Ele se diz bissexual e que já namorou várias garotas mas nunca se relacionou com um homem.
Certo dia, ele iniciou um desabafo comigo e se diz “preso” dentro de
uma realidade que ele gostaria que fosse diferente. Disse que sempre
viveu correspondendo às expectativas dos outros e nunca realizando seus
próprios desejos. Com isso ele disse que precisava matar a curiosidade
de ficar com outro homem e, com isso, ser o que ele gostaria de ser por
pelo menos um dia. Ele me pediu que proporcionasse isso à ele e eu me
prontifiquei, não pelo puro desejo, mas pelo bem que isso poderia fazer a
ele.
Conversamos normalmente nos dias seguintes, e há poucos dias fui até a
casa dele, e passamos a tarde juntos, vendo filme, conversando e se
divertindo. Eu realmente esperava que ele tentasse algo comigo, mas
disse que embora ele deseje, não consegue fazer isso, pois sente que é
errado, e ele mesmo se pune por isso. E não falávamos de sexo, apenas
beijos.
Argumentei com ele na tentativa de convencê-lo a se permitir a viver
este momento, mas ele realmente não se entregou. Não forcei a barra, e
terminamos o dia bem, sem ressentimentos nem recriminações. Ele vai
voltar à sua vida sentimental normal, namorando lindas garotas e
contendo seu desejo por homens. Mas eu não vou voltar ao meu estado
normal tão cedo, pois aquilo que eu queria ao máximo evitar, aconteceu: estou me apaixonando por ele.
Digo que gostaria de não me apaixonar porque ainda é cedo para que eu
encontre alguém que possa me corresponder da maneira que eu quero e
preciso, mas o destino sempre me prega essas peças.
De alguma forma, eu sinto que tenho o dever de libertá-lo, não
fazendo ele sair do armário, mas ser a pessoa com quem ele pode se abrir
e ser ele mesmo, sem recriminações. Ele não tem muito convívio com a
própria família, então sinto que devo estar ao lado dele, que devo fazer
a diferença na vida dele de alguma forma, mas não sei como (se é que é
possível).
VAMOS LÁ ARTHUR...
O nível de pureza no seu discurso é muito legal e quase posso afirmar
que vai gerar certa “raivinha” de alguns meninos e homens que passaram
por situações semelhantes a sua e que quebraram a cara pois, se
apaixonar por um gay ou bissexual que vive ainda essa fase de
descoberta, nem sequer teve uma experiência homossexual
e está nesse estado de “coito interrompido” – num conflito interno
entre os valores heteronormativos e as sensações homossexuais –
traumatiza e frustra muitos gays! Não é à toa que tal perfil é tão
condenado porque, nós gays, costumamos idealizar esse “jovem homem” e
entramos nessa espiral de fazê-lo encontrar a “luz”, de sermos os tais
“pacientes”, “compreensivos”, quase “Madre Teresa de Calcutá”.
De fato, apesar de raro, conheço um caso de um gay que se envolveu
por um “bissexual” (no caso as aspas fazem sentido) que até então só
tinha concretizado relações afetivas e sexuais com mulheres. Namoraram 5
ou 6 anos, as aspas desse “bissexual” caíram, encontrou-se gay, e
terminaram por desgastes que culminaram na traição do gay (original)… e
lá vai história pela frente, que não vem ao caso.
Mas no geral, entregar o afeto no formato de paixão por um jovem que
está vivendo esse momento de conflito ou trânsito é deveras complicado. O
final, se a gente for falar em estatísticas de e-mails que recebi e
histórias que eu conheço, tende a acabar no “quadradinho trivial”, do
gay que se sujeitou a viver essa experiência, viveu frutrações e passou a
repudiar perfis assim.
Não sei até que ponto, em sã consciência, um cara que vive nesse
estado é realmente alguém mal resolvido. Eis a minha opinião. Tem gente
que transita por anos e anos e estabelece um equilíbrio emocional e
psíquico sendo assim. Mas nós, gays, cobramos definições justamente para
estabelecer uma zona de segurança, para, sim, colocar fulano numa
“caixinha de conveniência do nosso ego”. A gente não aceita sempre o
bissexual, o g0y, entre outras derivações possíveis (de rótulos
discutíveis) porque pessoas assim nos tiram o chão, nos descaracterizam.
O resultado é que muitos gays preferem tratar homens desse perfil como
“todos traidores”, “todos promíscuos”, generalizações que “resolvem” as
frutrações do ego, mas que escancaram o preconceito. Conveniência.
Vamos voltar à “Madre Teresa”, algo que senti no final da sua
história: ela não existe em você e desculpe dizer. Por mais que você
queira ser o “amigão”, lá no fundo (ou nem tão fundo assim), você vai
esperar algo em troca. Relacionamentos são essencialmente feitos por
trocas. Não sei como é a sua personalidade de fato, mas ou você vai se
pegar em situações de cobrança em cima dele ou vai reprimir o
sentimento, quando não se anular. Em ambos os casos, a tendência é que
você fique mal pois a chance dele nivelar a relação por igual,
preenchendo suas expectativas, do seu esperado, é pequeno. Virão
provavelmente em migalhas, entre altos e baixos por parte dele.
Mas o bacana é que você buscou recorrer a alguém, no caso o HOMENS PELADOS, que
está trazendo uma certa consciência para você numa etapa “x” da sua
paixonite. Ter consciência nos tira certo privilégio do vitimismo (e
consequentemente do julgamento do banditismo da outra parte) e, se você
resolver mesmo encarar a “Madre Teresa” que existe dentro de você, é por
sua conta e risco!
Minha dica: entregue esse sentimento honesto da sua paixão para outra
pessoa ou defina seus propósitos a si, em respeito a ele, de maneira
bem clara. Já tive um relacionamento curto com um bissexual e sabia,
desde o dia que a gente se tocou pela primeira vez, que a minha
afetividade por ele começaria e acabaria no prefácio da história. Será
que você consegue ter esse tipo de controle?
Acredite: a chance dele comprar a sua pureza, a honestidade do seu
sentimento, é quase minúscula. Pra falar a verdade, dificilmente ele vai
conseguir enxergar porque ele não está pronto para isso. Se um dia ele
vai estar? É ele quem vai ter que descobrir… enquanto isso, o que ele
pode fazer é oferecer migalhas (sob o ponto de vista do gay, porque pra
ele, provavelmente, é até onde ele consegue chegar). São limitações
mesmo e, sabe, é difícil a gente julgar as limitações do outro quando o
assunto é socidade VS. homossexualidade VS. psique individual.
Um abraço e obrigado por compartilhar seu relato com os leitores e seguidores do Blog espero ter ajudado.
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